O agro no centro do impasse: por que Itália e França travam o acordo Mercosul-União Europeia

O agro no centro do impasse: por que Itália e França travam o acordo Mercosul-União Europeia

O agro no centro do impasse: por que Itália e França travam o acordo Mercosul-União Europeia

Por Fabio Ongaro, vice-presidente de finanças da Câmara Italiana do Comércio de São Paulo – Italcam, economista e empresário no Brasil, CEO da Energy Group

O novo adiamento da assinatura do acordo de livre comércio entre Mercosul e União Europeia não é fruto de improviso diplomático nem de protecionismo ocasional. Ele expressa um conflito estrutural entre dois modelos produtivos distintos. Itália e França, países com setores agroalimentares relevantes, competitivos e politicamente organizados, avaliam que o desenho atual do acordo cria uma concorrência desequilibrada, especialmente no segmento agrícola.

A agricultura europeia opera sob um arcabouço regulatório extremamente rigoroso. O produtor francês ou italiano enfrenta limites severos ao uso de defensivos agrícolas, exigências ambientais crescentes, regras trabalhistas rígidas, altos custos energéticos e obrigações relacionadas ao bem-estar animal. Além disso, carrega a pressão política de cumprir metas climáticas ambiciosas definidas pela própria União Europeia. Esse conjunto de exigências aumenta o custo final da produção e reduz a margem de manobra competitiva.

Nos países do Mercosul, por outro lado, a produção agropecuária se beneficia de vantagens naturais claras, como clima favorável, escala, disponibilidade de terra e produtividade elevada, combinadas com estruturas regulatórias menos onerosas. Embora haja avanços importantes em sustentabilidade e rastreabilidade, os custos sistêmicos ainda são significativamente inferiores aos enfrentados pelo agricultor europeu. Para França e Itália, permitir o acesso ampliado desses produtos ao mercado europeu sem mecanismos compensatórios significa importar não apenas alimentos, mas um modelo produtivo que não internaliza os mesmos custos políticos, ambientais e sociais.

O peso político do agro europeu e o limite da abertura comercial

O agro no centro do impasse: por que Itália e França travam o acordo Mercosul-União Europeia

O argumento da “concorrência desleal” utilizado por governos europeus não se refere a dumping clássico, mas a uma assimetria estrutural. O agricultor europeu é obrigado a produzir de acordo com padrões elevados impostos por políticas públicas, enquanto compete com produtos importados que não seguem regras equivalentes. Esse descompasso gera forte resistência interna.

Na França, o setor agrícola é historicamente mobilizado, organizado e simbolicamente central. Em um contexto de inflação alimentar, crise energética, instabilidade geopolítica e crescimento de forças populistas, qualquer governo que aceite uma abertura comercial percebida como ameaça à renda agrícola assume um risco político elevado. A Itália compartilha dessa lógica, sobretudo em cadeias sensíveis como carne, laticínios, vinhos e produtos de denominação de origem.

Outro ponto crítico é a questão ambiental. A União Europeia avançou em legislações que exigem rastreabilidade rigorosa e comprovação de ausência de desmatamento nas cadeias produtivas. Para os países do Mercosul, adaptar-se plenamente a essas exigências implica investimentos significativos, mudanças profundas e tempo. Para os europeus, abrir exceções enfraqueceria sua própria agenda climática e colocaria em xeque a coerência regulatória do bloco.

Diante disso, Itália e França não buscam necessariamente inviabilizar o acordo, mas reconfigurá-lo. Defendem cotas mais restritas, cláusulas de salvaguarda automáticas, exigências ambientais espelhadas e períodos de transição mais longos, de forma a reduzir o impacto sobre o produtor local.

Entre o adiamento e o acordo possível: o que realmente deve acontecer

Do lado do Mercosul, há frustração. O bloco vê no acordo uma oportunidade estratégica de acesso a um mercado sofisticado e de consolidação de sua vocação agroexportadora. Ainda assim, durante anos, subestimou a dimensão política e social do agro europeu, tratando a negociação principalmente como uma discussão tarifária.

O cenário mais provável não é o abandono do acordo, mas sua transformação. Uma assinatura rápida, nos moldes atuais, é improvável. O caminho tende a ser um acordo progressivo, condicionado e altamente regulado, com anexos ambientais mais rigorosos e mecanismos de controle mais sofisticados. A União Europeia dificilmente abrirá seu mercado agrícola sem instrumentos claros de proteção. O Mercosul, por sua vez, terá de decidir se aceita essas condições ou se preserva maior autonomia regulatória.

No fundo, o impasse revela um choque entre dois modelos de desenvolvimento agrícola: um fortemente regulado e politicamente protegido; outro baseado em escala, competitividade natural e inserção global. Sem uma arquitetura que torne essa convivência economicamente viável e politicamente sustentável, o acordo continuará sendo anunciado como iminente e adiado indefinidamente.

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