Revista Science publica pesquisa do CNPEM sobre estratégia inédita de bactéria que causa cancro cítrico
Estudo abre caminho para controle da doença que afetou plantações em todo o mundo, com prejuízos de bilhões de dólares
Pesquisadores do CNPEM (Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais), em Campinas (SP), participaram de uma descoberta inédita publicada na revista Science que revela um mecanismo sofisticado de ataque da bactéria causadora do cancro cítrico, a Xanthomonas citri. O estudo é de grande relevância para a citricultura mundial, já que o cancro cítrico foi responsável por operações de erradicação que removeram cerca de 16 milhões de árvores, principalmente laranjeiras e limoeiros, e custaram bilhões de dólares aos países produtores.

Os resultados abrem caminho para desenvolver estratégias de controle mais eficazes. Entre as possibilidades, estão a criação de citros com versões geneticamente modificadas, que não possam ser ativadas pela bactéria, e a identificação de moléculas capazes de interromper a liberação ou o consumo de açúcares no interior da planta usados para alimentar e proliferar essas bactérias.
A pesquisa é liderada pela University of Tübingen, da Alemanha, que convidou o CNPEM a participar por conta de sua excelência nos estudos realizados sobre o metabolismo de carboidratos desenvolvidos nos últimos 15 anos, o que o tornou uma referência mundial. No Brasil, o estudo foi desenvolvido com apoio do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
O trabalho identificou que o patógeno “hackeia” a planta, ativando um gene associado ao amadurecimento de frutos, o CsLOB1, para liberar açúcares das paredes celulares e usá-los como combustível para sua própria multiplicação.
O CNPEM, por meio de pesquisadores do Laboratório Nacional de Biorrenováveis (LNBR), liderou partes centrais do estudo, incluindo análises genômicas e bioquímicas que permitiram identificar as enzimas envolvidas na degradação da parede celular e o uso dos açúcares pela bactéria. O laboratório também contribuiu com a interpretação da rede metabólica ativada pela Xanthomonas, detalhando o impacto energético e funcional dessa exploração da planta.
“A descoberta desse mecanismo tem o potencial de gerar um impacto econômico no mundo e, em especial, no Brasil, que é o maior produtor e exportador mundial de suco de laranja, representando mais de 75% de todo o comércio mundial de suco de laranja. E essa descoberta não se limita a citricultura, pois o processo de controle de amadurecimento de frutos é conservado em outras plantas, podendo servir como ferramenta para todo o setor de fruticultura”, diz Mario Murakami, diretor do LNBR e coordenador das pesquisas no CNPEM.
Mecanismo
A pesquisa mostra que a bactéria injeta na planta uma proteína chamada PthA4, capaz de “ligar” o gene CsLOB1. Quando isso ocorre fora do contexto natural dos frutos, a planta passa a produzir enzimas que degradam a própria parede celular da planta, liberando carboidratos como glicose, frutose e xilose. Esse caldo bioquímico alimenta a Xanthomonas, acelerando sua proliferação e agravando a doença. O estudo também revela que a bactéria utiliza simultaneamente dois sistemas de secreção, um para desativar defesas da planta e outro para liberar enzimas degradadoras, em uma sinergia que intensifica a infecção.
Além de elucidar esse mecanismo molecular, os cientistas demonstraram que o gene CsLOB1, explorado pela bactéria, é naturalmente ativo no amadurecimento de frutos, o que explica por que a Xanthomonas se aproveita de um processo já existente no metabolismo vegetal. Foram encontrados ainda indícios de que mecanismos semelhantes operam em tomateiros, mostrando que este tipo de controle molecular pode ser conservado em outras espécies.
Sobre o CNPEM Link
O Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM) abriga um ambiente científico de fronteira, multiusuário e multidisciplinar, com ações em diferentes frentes do Sistema Nacional de CT&I. Organização Social supervisionada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), o CNPEM é impulsionado por pesquisas que impactam as áreas de saúde, energia, materiais renováveis e sustentabilidade. Responsável pelo Sirius, maior equipamento científico já construído no País. O CNPEM hoje desenvolve o projeto Orion, complexo laboratorial para pesquisas avançadas em patógenos. Equipes altamente especializadas em ciência e engenharia, infraestruturas sofisticadas abertas à comunidade científica, linhas estratégicas de investigação, projetos inovadores com o setor produtivo e formação de pesquisadores e estudantes compõem os pilares da atuação deste centro único no País, capaz de atuar como ponte entre conhecimento e inovação. As atividades de pesquisa e desenvolvimento do CNPEM são realizadas por seus Laboratórios Nacionais de: Luz Síncrotron (LNLS), Biociências (LNBio), Nanotecnologia (LNNano) e Biorrenováveis (LNBR), além de sua unidade de Tecnologia (DAT) e da Ilum Escola de Ciência, curso de bacharelado em Ciência e Tecnologia, com apoio do Ministério da Educação (MEC).






