Barragens em risco em Minas Gerais reacendem discussão faltando 14 dias para implementação de ações prevista em lei
Nova legislação entra em vigor em 25 de fevereiro e um dos destaques do guia Padrão Global da Indústria para Gestão de Rejeitos é o respeito aos direitos da população do entorno das barragens
As imagens de um bombeiro aos gritos pedindo “pelo amor de deus” que as pessoas deixassem suas casas para se protegerem de um possível rompimento de uma barragem na região central de Minas Gerais rapidamente viralizaram na internet na primeira semana de 2022. O incidente em Minas Gerais, felizmente, não se concretizou nessa barragem, mas reacendeu a preocupação com os rompimentos de barragem a um mês do prazo para entrada em vigor das novas normas que vão reger suas construções e manutenções no país.
O prazo para implementação de várias ações previstas na nova legislação, como a descaracterização de barragens a montante do estado de Minas Gerais, se encerra em 25 de fevereiro de 2022, e as empresas do setor de mineração aceleram suas ações para estar em dia com todas as exigências da lei. Entretanto, segundo dados apresentados no último dia 20, em Belo Horizonte, pela Associação Nacional de Mineração (ANM), o Estado de Minas Gerais tem 44 barragens de rejeitos de minério construídas a montante e a descaracterização não vai acontecer a tempo em pelo menos 25 delas.
Ao todo, três mudanças foram feitas na legislação em 2020 e uma em janeiro de 2021 e fica evidente que a cultura da prevenção entrou no radar, face ao cenário que decorre dos rompimentos de barragens. O desafio tem sido enfrentado pelas comunidades atingidas, pelo poder público, pela população em geral e pelas próprias empresas responsáveis pelos empreendimentos.
“A partir do trabalho que desenvolvemos na Synergia, vejo mudanças positivas na legislação relativa à segurança de barragens a partir de 2020, com a criação de novas exigências, que vão além do técnico-operacional e abrangem uma abordagem integrada, envolvendo o conhecimento e o respeito ao território, e participativa, porque preveem o estímulo ao engajamento da população afetada”, explica Valéria Nader Sampaio, gerente de projetos da consultoria, que há anos atua no mercado de mineração.
O Guia Padrão Global da Indústria para Gestão de Rejeitos, de agosto de 2020, também reforça essa necessidade de respeitar os direitos de pessoas afetadas, buscando engajá-las significativamente em todas as etapas da situação. A publicação também destaca que a utilização de uma base integrada de conhecimento, social, econômico, ambiental, é essencial para o desenvolvimento de um projeto robusto de gestão de risco. Gestão e governança são também destacados nos novos protocolos a serem adotados, como a designação de um engenheiro de registro que possa identificar precocemente fragilidades e estabelecer políticas para apoiar a segurança e a integridade das estruturas de disposição de rejeitos.
As aplicações necessárias para o desenvolvimento de Planos de Contingência e para a emissão de ACOS (Avaliação de Conformidade e Operacionalidade) trazem uma visão geral e sistêmica dos procedimentos técnicos e operacionais impostos pela legislação vigente, que foi objeto de mudanças e avanços no último ano, dada a gravidade e a escalada dos acidentes com barragens. Face ao maior rigor de que se revestiu a legislação, essas aplicações vêm entrando crescentemente na agenda dos empreendedores, para se alinharem e responderem às imposições em vigor.
Valéria Nader Sampaio explica que, quando se olha uma lista de medidas exigidas nos Planos de Contingência e ACOs, o grande desafio é pensar para além da tecnicalidade e que grandes obras precisam estar associadas à gestão coletiva de riscos, indo além da versão mecanicista e burocrática que muitas vezes deu a tônica de planos associados à segurança de barragem.
Para colocar a população em segurança e para a implementar as melhores medidas, com a previsão de recursos e responsabilidades, é crucial o mapeamento detalhado e o conhecimento aprofundado do território, das comunidades locais e da população em geral. O cadastramento de populações em zonas de risco, em ZAS (Zona de Autossalvamento) e ZSS (Zona de Salvamento Secundário), por exemplo, deve ser feito a partir de um trabalho de engajamento das comunidades, com transparência e ampla divulgação. “Aderência ao território, participação da população e comunicação assertiva podem ser tomadas, assim, como uma tríade essencial e inseparável desse processo”, conclui a executiva.
Para levarem a cabo um trabalho de tal complexidade, em sintonia com as novas exigências e paradigmas, os atores e/ou empresas que por ele se responsabilizarem precisam estar aptos a oferecerem soluções estratégicas e visão integrada. Isso implica, necessariamente:
1) identificação de sensibilidades sociais e ambientais nas áreas de estudo;
2) criação de estruturas de apoio e fornecimento de bens e serviços para situações de emergência;
3) levantamentos cartográficos e sistema de informação georreferenciada;
4) relacionamento e busca de engajamento das comunidades;
5) interlocução com atores-chave;
6) comunicação assertiva, impingindo ampla transparência ao processo;
7) aplicação de pesquisas quantitativas e qualitativas, de forma a cumprir com os novos dispositivos legais;
8) consolidação das informações, com elaboração de painel com todos os cadastros de moradores, estabelecimentos, equipamentos e fornecedores.
Em resumo, conforme a executiva, tornar o trabalho visível e rastreável é fundamental.
“Não podemos esquecer das deficiências existentes na outra ponta da cadeia voltada à prevenção de acidentes em barragens: o monitoramento e a fiscalização quanto à aplicação eficiente das leis. O aperfeiçoamento desse processo é, obviamente, primordial para a segurança das barragens, mas também exigirá o engajamento da sociedade para se consolidar”, completa Valéria.
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